domingo, 29 de janeiro de 2012

O Paraíso de Um Dia e Uma Noite

Era uma manhã fria e chuvosa e o bonito casal entrelaçava suas pernas por entre os cobertores quase como uma dança lenta e sentimental, sem, no entanto, desmanchar o abraço passional que os envolvia. O sol iluminava o quarto por entre as cortinas em tons fortes de vermelho e laranja, uma luz tímida e sem muito efeito, com os raios encontrando brechas entre as nuvens em um céu nublado e cinza. Muito adequado ao momento.
Nenhum dos dois estava interessado em deixar o pequeno apartamento no subúrbio calmo, quase escondido, na grande cidade de arranha-céus. Na verdade, relutavam até mesmo com a idéia de sair do aconchego da cama, do mundo perfeito que eram os móveis do quarto envolvidos pela felicidade, quase ingênua, daqueles dois seres, perfeitamente felizes. Abriam os olhos apenas pelo prazer de ver o sorriso um do outro, pois já estavam completamente satisfeitos com o encontrar sutil e cego de seus corpos.
Uniam suas mãos e riam-se, conscientes da felicidade quase insana que sentiam. Tocavam seus lábios e sentiam o hálito um do outro como um elixir raro e único, feito especialmente para aquele momento e para aquelas duas pessoas. Era um encontro terreno e carnal, porém continha um aura tão angelical e celeste que parecia ter sido esculpido por forças etéreas, com o objetivo único de ser pintado pelo mais talentoso artista da Renascença. Um momento que poderia durar segundos ou dias ou anos sem perder sua mágica, praticamente tangível.
A chuva continuava intensa e dava aos apaixonados um pretexto para não abandonarem o conforto um do outro. O barulho do cair das gotas fazia-se plano de fundo para o unir dos cabelos negros e o rolar dos corpos sobre a cama. Risos irrompiam entre o balançar das cortinas e sussurros procuravam ouvidos serenos e esperançosos por entre os ruídos do dia. As palavras, poucas, soltas e em demasiado significativas, chegavam de forma leve e lenta a mente florida de ambos, provocando inevitáveis arrepios de paixão.
Certas vezes, ela adormecia entre os braços dele e, então, ele a observava em seu sono, absorto pela beleza daquele momento. Outras vezes, ela acordava ainda abraçada nele, agora adormecido, e levantava os olhos para assistir ao espetáculo de seu cabelo a balançar com a brisa, emoldurando um rosto tão querido. Algumas outras vezes ainda, os dois cruzavam olhares observadores e perdiam-se no rosto sorridente um do outro para, então, abraçarem-se e consumirem-se, como se aquele fosse um abraço esperado por muitos anos.
Aquele era um momento tão único que jamais poderia durar para sempre. Não suportaria se quer o tempo de dois ou três dias e ambos os amantes sabiam disso. Um dia e uma noite nunca seriam desse modo se não fosse únicos. Era certo que no amanhecer que seguiria aquele, ele a deixaria dormir em seus braços e, como antes, observaria seu lindo rosto entrar em sintonia com a paz que ele sentia ao vê-la. Entretanto, ele se desprenderia dela silenciosamente, beijaria sua testa com cautela e vestiria seu imponente uniforme de guerra.
Depois de minutos saudosos olhando a janela, uma vista que emoldurava momentos felizes, caminharia para fora do aposento tentando não olhar para o que deixava para trás. Colocaria a carta, já escrita, sobre a escrivaninha, junto às flores. Tentaria, sem sucesso, conter as lágrimas, marcando o papel escrito. Guardaria a foto dos dois, tirada ainda naquela manhã, com uma dedicatória na caligrafia fina e delicada dela.
Já de saída, marcaria com a chave, na porta de madeira, mais um coração, em meio a tantos outros que perdera a conta. Dentro, estaria escrita, a data de sua volta. Ele iria rir com a idéia de outra porta para abrigar tantos corações. Em seguida, porém, olharia uma última vez para a doce mulher que tanto amava e as lágrimas correriam. Então, com um apaixonado e lento mexer de lábios seria possível decifrar seu adeus, em um triste e esperançoso “Até logo, meu amor.”

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