terça-feira, 30 de agosto de 2011

Devaneios

Entenda como um apelo sutil
Minha mente borbulhante a pulsar
Entenda como um pedido senil
Meu corpo frágil e sem sentido a suspirar

Noite passada decidi enlouquecer
Notei a mudança de cores com a luz
Não venha me perguntar por quê
Voei serena nas notas do blues

Ultrapassei os limites da dor
Procurei a fuga da realidade
Pedi aos céus mais amor
Aos homens, mais verdade

Não cabia aos homens o sentimento
Isso é do que não se tem explicação
Não cabe a mim tanto pensamento.
Não peça ao destino: razão.

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Parasita


Você está procurando por uma morte fácil?
Acha que essa é a cura para seus sofrimentos?
Está errado, está tudo errado.
Sorria e carregue esse fardo.

Você acha que a vida está sendo injusta?
Acha que isso é algo contra você?
Mas você está errado, está todo errado.
Sorrindo carregue esse fardo.

Se sofrer fosse pré-morte
Todos seríamos felizes
Sofrimento é tarefa pra ser forte
Ensinamento pra ser livre

Você faz seu próprio correr
Em todos os sentidos
Por motivos de bem ou de mal

Você mata sua própria vida sem querer
E parece achar natural

Estou vendo
No profundo vazio de seus olhos
A procura por uma morte fácil

Mas eu sei que não é esse o desejo
Eu sei que não é o que realmente vejo

Eu quero saber o motivo
Quero entender seu suplício
Mas não posso, não cabe a mim

Eu quero ver o ser vivo
Que alimenta seu louco vício
De sofrer sempre assim.

quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Despedida

Olá sofá manchado de café. Olá assoalho opaco. Olá janela, cortina, flores secas no vaso de cerâmica. Olá. Minhas mãos corriam os móveis aconchegantes no meu apartamento do quinto andar. Aconchegante era a palavra certa, meu a palavra errada. Não entendo o motivo mas era uma despedida triste. Os meus passos silenciosos sobre o tapete, o vento frio e audacioso sacudindo meus sonhos presos na rede entre o círculo, o sol entrando sorrateiro pela janela colorida de anilina, as lembranças em sépia que invadiam minha mente em cada cômodo: o adeus que continha uma tristeza incompreendida. Era suave a sensação de estar segura. Suave, prestes a se desmanchar.
Afinal, o que eu estava fazendo ali mesmo? Eu vim dizer adeus. Despedir-me das taças de vinho, da pipoca no sofá, das marcas de sol no chão de madeira, dos quadrinhos de flores da parede da cozinha. Nunca imaginei que teria de vir me despedir. Achei que seria um alívio mudar. Mas durante todos esses anos de trabalho árduo para crescer, para ver meus objetivos na linha do horizonte e não nas nuvens de sonhos, o mais feliz foi voltar pra casa e vê-la me receber de braços abertos. Felicidade era saber que lá era meu lugar.
Eu tinha um lugar novo agora. Amplo, bem projetado, harmonioso, moderno, central, digno da mais pura elegância. Era meu presente. Achei que merecia já que, esperava eu, havia conquistado o que sempre quis. Eu era bem sucedida. Eu estava feliz na minha realização, na profissão que era... Um sonho? A realização de um sonho? O auge da minha vida? Será que era realmente esse? Eu perguntava-me, instigada, sentada na cama, aquela colcha de retalhos, de frente para a janela, as flores lá embaixo. Não havia bosque ou flores no centro. Minha nova vida era lá. Não havia paz, ou sol no centro. Minha nova vida era lá.
Eu me senti um pouco tola em perceber que na verdade tudo que eu queria era o que eu estava deixando para trás. As manhãs com cheiro de café e pássaros a cantar. As tardes pintando as paredes do quarto, porque verde musgo não parecia uma boa escolha.  As noites observando o céu sob as árvores do bosque lá embaixo. Agora que a mudança estava prestes a se tornar real, eu via o grande erro que havia cometido. Trocado o sentimento pelo tangível.
Quão irônico tudo isso parecia ser. Eu estava crente que subir as escadas rumo a um futuro promissor era apenas um pré-requisito, algo necessário para a felicidade. Na verdade, as escadas eram a felicidade. Cada degrau, um novo momento para sorrir. Eu não estava fascinada pelo objetivo, mas pelo rumo que ele havia me levado. Pela vida que acontecia enquanto eu tentava alcançá-lo.
Abracei as almofadas de veludo e senti pela última vez o cheiro de rosas. Adeus lar. Meu sussurro de saudades. Na sala estava, a última caixa que faltava, nela a máquina fotográfica e o quadro de desejos. Talvez eu pudesse voltar um dia. Tirei algumas fotos do lugar, do bosque, do papel de parede listrado. Tranquei a porta. Eu, a caixa, minhas saudades, meu adeus. Onde estará meu lar agora? “Nova casa”. Apaguei o desejo que ainda restava no quadro. “Novo lar”. Foi o primeiro da nova lista.

segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Vazio

Estou cansada dessa dor
No meu físico, no meu ser vivo
No meu ser viver
No meu nada sem querer

Estou cansada dessa dor
Desses beliscos, desses sonos sem dó
Dessas noites mal dormidas
Dessas chuvas sem medidas

Estou cansada de estar cansada
De toda essa dor que me consome

Estou cansada de fingir e seguir
Como se não pudesse me arrepender

Estou cansada de ficar estática
E só ver a vida passar, independente
Como num filme, como num teatro...
De fantoches.

Estou só cansada
Uma canseira que me cansa
Porque não sei como livrar-me dela

Canseira da vida e de viver só
Só assim, nesse meio termo

Estou cansada dessa dor
Estou cansada desse ardor, desse amor
Sem querer.

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Escadas

Um dia eu acordei decida
Como sol na manhã, renovada
Queria construir de novo a vida
Queria uma nova caminhada

Construi um castelo de areia
E saí pra vida me consumir
Encontrei essa tristeza que me permeia
E corri através dos medos pra fugir

Tentei mais um dia e outro
Mas a pura água não foi gentil
Percebeu meu olhar solto
E meu castelo de areia destruiu

Então corri, desanimada, sozinha
Perdida, sem meios de seguir
Mas no escuro vi luz onde não tinha
Havia anjos a me perseguir.

Ainda guardo tudo de ruim comigo
Não deixo transparecer
Tudo que preciso é de um abrigo
Para as mágoas que insistiram em crescer

No rosto dos meus anjos, ou amigos
Não quero ver preocupação
Pois preso seus sorrisos
São a minha razão

Cansei do castelinho
Mas esse, poderia durar
Pois como o pássaro tem um ninho
Também queria um lugar pra me abrigar.

terça-feira, 9 de agosto de 2011

Angústia

Não nasci pra isso não
Essa pressa de vida moderna
Esse dia a dia de expectativas
Essas vontades reprimidas

Não nasci pra essa pressão
Pra ser compensação
Não nasci pra engolir
Nasci pra pensar
Assim quero seguir

Não cresci pra isso
Quando se descobre o querer
É tarde demais pra escolher
Presos ao mesmo do início

Não nasci, nem cresci
Não sei como viver
Com isso, com evoluir?

Não nasci pra essa vida
Nem sei isso é vida

É só um sobreviver
Substituído o viver
Que se deveria ter

É só um respirar
Substituindo o inspirar
Pelo qual se deveria lutar 

domingo, 7 de agosto de 2011

Sorrisos

Há tanto tempo,
Tanto ódio
E ao mesmo tempo
Tanto amor

É tanto som e
Tanto silencio
Que só me perco
Por ser só

Tanto chorar
E tanto se arrepender
Mas tanto se importar
E tanto viver

São tantos que
Por tanto tempo
Estão a se importar

Tantos que
Em algum momento
Quiseram demonstrar

Mas a tantos outros
Que por algum motivo
Resolvi deixar

Mas esses poucos tantos
Que me sobraram
São os que vem me buscar.

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Consolo, onde estás?

A chuva cai como mágoa lá fora
Assim como as lágrimas no meu rosto
Eu reclamo meus direitos de desgosto
Sem ninguém pra me abraçar.

É frio na rua fora de mim
Mas há frio aqui dentro também
A lua desponta no céu como marfim
E para me consolar: ninguém.

Quando tento me desfazer do peso
Sem um colo a me confortar
Escuto os ecos da realidade
Contra a qual quero lutar.

É escuro na rua fora de mim
Mas há escuridão aqui dentro também
No vazio um breu sem luz no fim
E para me guiar: ninguém.

Lágrimas! Oh lágrimas!
(Quão traiçoeiras podem ser?)
Intensifica em meus olhos a cor
Rubra meu rosto de dor
E para perceber: ninguém.

Descoberta

Eu notei a pouco tempo
Que mentir pra si mesmo
Sobre o que não se tem discernimento
Não é, em si, uma solução

Eu notei por olhos de outro
Que talvez haja aflorado por dentro
Algum sentimento

Notei que minto a mim
Por tanto tempo
Que qualquer deslize de temperamento
Me parece errado

Eu notei que talvez meu sorriso
Não seja só de momento
Talvez seja enamorado.