quinta-feira, 8 de agosto de 2013

Sangue Sujo de Amor

Eu estava com lágrimas nos olhos quando ele foi embora. Lembro muito bem. Ele saiu caminhando calmamente de mãos dadas com uma menina loira sorridente que usava vestidos floridos. Lágrimas jorravam dos meus olhos opacos e pintavam meu rosto pálido de preto. As muitas gotas escorriam carregando minha maquiagem escura e mascarando minha mente obscura. As lágrimas levavam a solidão e a tristeza de mim, deixando apenas ira e insanidade. Nos olhos escuros eu escondia a visão perfeita daquele momento: urrando, eu corria e fincava uma estaca naquelas mãos entrelaçadas num ato grosseiro e insano. Uma estaca (mal)feita com minhas próprias mãos. Aquela que eu guardava na terceira gaveta da cômoda do nosso quarto sujo e bagunçado, junto com alguns maços de cigarro e uns CD’s pirateados que você comprou daquele seu amigo nojento cheirador de pedra. Para que guardar uma estaca no quarto? Bem, aí estava sua resposta.
Como eu queria que aquilo estivesse acontecendo. Eu queria ver, eu queria sentir a estaca perfurar lentamente a mão dele e daquela pequena ovelhinha branca. Eu queria ver as farpas resultantes da minha pouca habilidade como artesã ferirem a pele macia e hidratada da sua nova namorada. Queria sentir o cheiro do sangue escorrendo por aquelas unhas feitas e observar o líquido sujar seu lindo esmalte rosa bebê. Eu queria ver o terror estampado nos rostos felizes dos dois amantes. Queria ouvir o grito de dor. Queria ser tentada a sentir pena.
Naquele momento, mais que tudo na vida, mas do que um dia quis que você não tivesse ido embora, eu queria, do fundo do meu coração, que ambos estivessem mortos. Bem ali na minha frente: mortos. Os corpos deitados, as duas cabeças numa única poça de sangue, um olhando para o outro. As mãos eternamente dadas com o auxílio do meu artefato de madeira. Descansando para sempre com a lembrança dos olhos do outro a morrer ao seu lado.
Eu enterraria os corpos, então, e não choraria uma lágrima pela morte dele. Gastaria o dinheiro idiota que ele havia deixado na minha casa convidando os amigos nojentos dele para comemorar a sua morte. Estariam todos bêbados ou drogados demais para lamentar. Eu teria uma overdose naquela noite com a esperança de jamais acordar de novo. Não me importaria morrer porque não havia nada a perder. A única coisa que me sobrava nesse mundo imundo estava caminhando para longe de mim sorrindo para uma garota que não se parecia nem um pouco comigo.
Foi assustador como a revelação do nada que eu vivia fez com que meu choro parecesse um grito desesperado. Lembro-me de ter visto a nova senhora Torres olhar levemente para trás, desviando o seu olhar e me encarando. Lembro-me de você ter acompanhado o olhar dela e murmurado qualquer merda que não me interessava. Lembro-me de os dois dando-me as costas novamente com uma expressão clara de pena nos rostos. Naquele momento, então, mais que vê-los sem vida, mortos e enterrados, eu mesma queria matá-los. Queria ver a vida sumir dos seus semblantes alegres e, com uma vontade que ardia nos meus olhos, queria que a culpa fosse minha. 

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